O planejamento sucessório, ao contrário do que se imagina, é um estudo recente, passando a ter uma importância maior nos últimos anos, quem sabe, pela ênfase que a Governança Corporativa vem tentando incutir no empresariado de uma forma geral, com suas concepções de perpetuação dos negócios e diminuição de conflitos entre herdeiros e sucessores. As projeções em vida daquilo que se espera após a morte, sempre foram objeto de doações ou disposições de última vontade (testamentos), somados as diretrizes antecipativas (denominadas por alguns como testamento vital – daquilo que não seria material propriamente dito), lembrando que nosso ordenamento não permite doações para animais, como autorizado em outras legislações. O artigo 426 do Código Civil brasileiro, estabelece que: “Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.”. Aliás, essa disposição já constava no artigo 1.089 do CC/1916. A doutrina defensora do entendimento da proibição do pacto sucessório de contratar herança de pessoa viva, sempre se baseou nos aspectos da imoralidade, pelo possível desejo da morte da pessoa, inclusive com tentação ao crime, ou que, com a convenção, poderia privar alguém que dela dependesse, em favorecimento de quem nunca poderia herdar, bem como, que as disposições de última vontade são revogáveis, até o momento da morte. Pela lei brasileira, a herança somente pode ser renunciada após aberta. Assim, por essa concepção em vida, o cônjuge não pode renunciar a herança, todavia, isso é permitido ao cônjuge sobrevivente após a morte do consorte. A respeito da proibição dos pactos sucessórios, podemos sintetizar em sentimentos imorais de especulação sobre a morte de alguém para obter vantagem patrimonial, podendo inclusive fomentar desejo de morte, cobiçando seus bens e o pacto sucessório restringiria a autonomia ou liberdade de testar. Por outro lado, a liberdade contratual que pode ser exercida em três momentos distintos (pré, durante e ao final da relação) entre os cônjuges, calca-se na faculdade de pactuarem garantias de direito real e pessoal a favor do outro, pelas convenções matrimoniais. A separação dos cônjuges que algumas décadas atrás era incomum, atualmente tornou-se normal, tentando o Poder Judiciário solucionar os conflitos que a ele chegam, da maneira que melhor parece ser, para aquele momento, divergindo em vários aspectos, de tempos em tempos. Em 10 de maio de 2017 o Supremo Tribunal Federal julgou o Recurso Extraordinário 878.694/MG sob a Relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso, declarando a inconstitucionalidade da distinção do regime sucessório entre cônjuges e companheiros, asseverando em seu voto que: “É importante observar, porém, que a declaração de inconstitucionalidade da distinção dos regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, prevista no art. 1.790 do CC/2002, não impede uma futura atuação do legislador no sentido de garantir a possibilidade de exercício da autonomia de vontade pelos companheiros (e também pelos cônjuges). Desde que mantenha a equiparação de regimes sucessórios entre o casamento e a união estável como regra geral, o Poder Legislativo poderá criar regime sucessório diverso, ao qual os companheiros poderão optar, em vida, mediante acordo escrito. Nesse caso, porém, para que não se viole a presente decisão, será preciso fixar-se que, não havendo convenção, será aplicável a união estável o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002.”. Desta forma, parece-nos que o nossa Suprema Corte afastou qualquer limitação fática ou jurídica que proíba cônjuges e companheiros de exercitarem a autonomia de vontade, pactuando, inclusive, renúncia sucessória. Os cônjuges quando livremente estabelecem casamentos pela separação de bens, estão fazendo-o, obviamente, para que não haja comunicação de seu patrimônio com o da família de seu consorte, tanto no divórcio ou no falecimento, em que haja a determinação sucessória, principalmente com filhos ou genitores vivos. A intervenção estatal através da legislação, assegurando a solidariedade conjugal, mecanismos de proteção aos cônjuge ou convivente sobrevivente, para que este não passe necessidades materiais, principalmente em estado avançado de idade, em detrimento da transferência para filhos ou ascendentes que disponham de patrimônio ou capacidade de auferir renda, é extremamente necessária, todavia, nos parece que esse não é o caso de efetiva renúncia, por quem desse patrimônio não necessita ou necessitará, ou mesmo plenamente capaz de continuar ou vir a auferir recursos capazes a sobrevivência, afugentando assim a sensação, muitas vezes existente, entre casais, de que as relações são de interesse patrimonial e não afetivas. O Recurso Especial 1.472.945/RJ de Relatoria do Ministro Villas Boas Cuêva, leciona que o art. 1.829 do CC, confere ao cônjuge viúvo o “mínimo necessário para a sobrevivência digna”, levando a crer que a renúncia é possível, desde que, não haja qualquer suspeita de violação ou vício de consentimento por parte do renunciante, assegurando-lhe a sobrevivência digna. Para finalizar, esse entendimento pela flexibilização a proibição de pactos sobre herança, parece-nos estar calcada em uma tendência mundial, inclusive com o intuito de consolidar regras, propiciando, maior segurança jurídica em critérios de governança corporativa para empresas familiares, muitas delas, com seus Estatutos, Contratos Sociais e Acordos de Sócios, firmados com profunda base de intuito persona e não de capital, evitando-se o ingresso de familiares de cônjuges ou conviventes, sem qualquer afinidade com os fundadores, seus herdeiros e sucessores.