A grave crise econômica que assola o país influenciou drasticamente na construção de um novo sistema de remuneração de executivos, que cada vez mais aderem ao modelo de remuneração variável em substituição ao de salário fixo.
Uma das possibilidades desse sistema é denominada de “stock option” e consiste na expectativa do direito de comprar ações por um preço fixo dentro de um prazo determinado, por meio de um plano previamente aprovado. A adoção desse sistema é cada vez mais presente nas empresas brasileiras que, à mingua de legislação específica, ainda enfrentam o desafio adicional de compatibilizar as regras locais às estratégias de governança, nos casos que envolvem multinacionais.
A opção pode ser comprada ou vendida (“call option” ou “put option”), ou pode ser outorgada por um indivíduo pela empresa (“employee stock option”) ou, ainda, pode decorrer de um contrato de natureza mercantil (“call option” or “put option”).
A posição majoritária atual é no sentido de que a natureza jurídica do plano de stock option é de contrato mercantil
O plano de stock options pode conter os seguintes elementos: preço de exercício – preço pelo qual o empregado tem o direito de exercer sua opção (exercise price); prazo de carência – regras ou condições para o exercício das opções (vesting) e termo de opção – prazo máximo para o exercício da opção de compra da ação (expiration date): o preço de exercício é o preço de mercado da ação na data da concessão da opção, sendo comum estabelecer-se um desconto ou um prêmio sobre o valor do mercado.
Diante de todas estas novas possibilidades, ainda persiste a dúvida a respeito do tratamento jurídico do stock option, já que pode assumir caráter salarial ou possuir natureza de investimento, existindo atualmente decisões administrativas e judiciais que consideram a respectiva natureza jurídica balizando as características específicas de cada plano e do caso concreto avaliado.
A análise das decisões recentes da Justiça Federal e Trabalhista permite a identificação de que a posição majoritária atual é no sentido de que a natureza jurídica do plano de stock option é de contrato mercantil, desvinculado do contrato de trabalho, sendo que os eventuais ganhos auferidos por empregados, quando da venda das ações adquiridas através do plano, não teriam nenhuma implicação trabalhista, desde que observados alguns requisitos mínimos.
Dentre eles, podemos citar a necessidade do plano de stock option ser elaborado de acordo com a legislação societária aplicável à empresa emissora das ações; que a implementação do plano seja realizada em documentos apartados e desvinculados do contrato de trabalho a fim de não pairar dúvidas sobre sua natureza mercantil e aleatória. Além de possuir o contrato de stock option natureza onerosa, ou seja, o empregado deve desembolsar o valor da opção, não devendo haver subsídios por parte da empresa. A diferença entre o valor de opção e o valor efetivo da ação no mercado deve ser relevante a fim de comprovar a existência efetiva de risco com a flutuação do valor das ações no mercado de capitais.
Por fim, a compra de ações pelo empregado deve, sempre que possível, ser intermediada por profissionais competentes (como corretor de valores mobiliários e advogado), respeitando-se as normas que regulam a compra e venda de valores mobiliários. No entanto, tem-se que o próprio Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) baliza seu entendimento conforme as peculiaridades de cada caso, o que gera a necessidade das empresas revisitarem seus planos de compra de ações, atualizando-os conforme decisões atuais.
Isso porque a posição da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), em sentindo contrário, em sessão de março de 2018, manteve a autuação lavrada em face de instituição bancária, que exige contribuição previdência sobre valores de fevereiro, março, abril, junho, setembro e dezembro de 2009, incidentes sobre as remunerações pagas a alguns diretores por meio da outorga de opções de compra de ações (Proc. nº 16327.721357/2012-24, Acórdão 9202-006.628). A decisão, por voto de qualidade – desempate do presidente – concluiu que a emissão da opção de compra de ações transmutava-se em remuneração desde 1996, após análise de documentos enviados pelo banco à Security Exchange (SEC).
Por outro lado, em dezembro de 2018, o próprio Carf entendeu que no contexto de operação de mercado de oferta pública de ações, as vantagens diferenciadas colocadas à disposição dos funcionários de outra instituição para aquisição de valores mobiliários não possuem caráter remuneratório, mas sim a natureza de ganho eventual e, portanto, não sujeitas à incidência de contribuições previdenciárias. (Proc. nº 10166.728875/201444, Acórdão 2202-004.844)
Diante do cenário de insegurança jurídica, com embates divergentes da esfera administrativa e judiciária, é necessário que as empresas submetam seus planos de compra de ações às parametrizações das decisões proferidas pelo Carf, as quais espelham as condutas que serão adotadas pela fiscalização, para não serem surpreendidas com pesadas autuações.
Matéria publicada no Jornal Valor Econômico: